Grupo Jornaleiros
Ataques no teatro Dubrovka, ataques na escola de Beslan, ataques no metrô de Moscou em 2004 e 2010. Incidentes lamentáveis da história recente da Rússia, todos ligados a grupos terroristas que pugnam pela independência da República da Chechênia. Embora essa e as outras 20 repúblicas da Rússia gozem de uma autonomia política que lhes permite terem constituição e língua próprias, a ligação direta com o Kremlin não agrada certos grupos da república majoritariamente muçulmana. Se há autonomia, por que os ataques terroristas acontecem e tiram tantas vidas (só os atentados mencionados acima mataram mais de 600 pessoas)?
A Rússia (oficialmente Federação Russa) é o maior país do mundo em extensão territorial. Uma ex-república soviética, hoje é composta por 46 províncias (oblasts), 21 repúblicas, nove territórios (krais), quatro distritos autônomos, duas cidades autônomas (a capital Moscou faz parte dessa dupla juntamente com São Petesburgo) e uma província autônoma, totalizando 83 subdivisões. Enquanto as repúblicas tem uma maior autonomia, os oblasts e krais são ligados fortemente ao governo federal, funcionando praticamente como os estados brasileiros. A diferença entre um oblast e um krai é essencialmente histórica: todos os krais foram, em algum momento da história russa, regiões de fronteira. A província autônoma é chamada “Oblast Autônoma Judaico”. A diminuta subdivisão foi criada durante o regime stalinista para que a população judaica pudesse preservar sua cultura iídiche num ambiente socialista. Apesar do nome, atualmente os judeus formam uma porcentagem ínfima da população local. As cidades autônomas são grandes cidades que funcionam como regiões autônomas. Por fim, os distritos autônomos são distritos que gozam de certa autonomia mas ainda são não só subdivisões russas como parte de outras subdivisões.
A Chechênia fica localizada no sul da Rússia, fazendo fronteira com a Geórgia. A população local se converteu ao islamismo no século XVIII e, como conseqüência, foi subjugada pela monarquia czarista cristã. Chegou a ser independente, mas atualmente encontra-se novamente em poder do governo Russo, que alega não conceder independência total à república muçulmana por que isso serviria de pretexto para que outras repúblicas reivindicassem a independência delas, resultando numa fragmentação da federação. Contudo, haveria outro interesse por trás da manutenção da vinculação da Chechênia ao Kremlin: os oleodutos que saem do Mar Cáspio e passam pela república para abastecer o mercado russo. Perder a Chechênia significaria encarecer o custo do transporte do petróleo coletado no maior lago do mundo, já que o “atalho” não se encontraria mais disponível.
O contexto russo-chechênio nos leva ao debate de até onde um estado federativo é eficaz e eficiente. O federalismo prega uma unidade federal que lidere um grupo de estados que ainda mantenham certa autonomia. É o sistema vigente na Alemanha, no Brasil, nos Estados Unidos e em muitos outros países, além da própria Rússia pós-Guerra Fria. No entanto, sendo a Rússia um país gigantesco, etnicamente diverso, e com um histórico de regimes autoritários e imperialistas, já era de se esperar que o estado federal não agradasse a todos. A política de anexação russa foi um grande problema: o fato da região chechena ser islâmica, em contraponto ao cristianismo russo, criou um impasse que impossibilita a paz permanente. A unidade desejada pelo federalismo não ocorre em sua totalidade pelo fato da ação ter sido mal planejada no longínquo czarismo russo, no século XIX. Mesmo a República da Chechênia sendo autônoma o suficiente par ter sua própria língua e sua própria constituição, isso não satisfaz boa parte da população local, que quer independência total devido às disparidades religiosas e culturais.
E não só na Rússia se verifica esse problema. No Canadá, que mescla federalismo com parlamentarismo, a província de Quebéc reivindica sua autonomia por ter uma herança sociocultural essencialmente francesa, enquanto que aqui mesmo no Brasil verifica-se um movimento separatista na região Sul do país (em especial no estado do Rio Grande do Sul), que se considera diferente do resto do país por sua influência germânica, em oposição à influência lusitana das outras partes do pai. Até o estado de São Paulo é palco de um movimento separatista de proporções ainda diminutas, que pedem no mínimo a autonomia do estado, que é considerado a locomotiva do Brasil.
Embora seja reprovável a atitude das partes que se sentem prejudicadas em tal situação, é inegável que os fatores étnicos e culturais dificultam a execução plena e estável de um regime federalista. Quando estão reunidas várias culturas diferentes em uma mesma federação, é possível identificar instabilidades, que muitas vezes são reprimidas em forma de guerra civil.
segunda-feira, 17 de maio de 2010
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Pequena correção no penúltimo parágrafo: "em oposição à influência lusitana das outras partes do PAÍS."
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