Moderação. Se precisássemos sintetizar o pensamento de Montesquieu, provavelmente esta seria a palavra mais indicada. Nascido em uma família nobre, Montesquieu foi capaz de visualizar já em sua época (final do século XVII e início do XVIII) a grande transformação que se operava na sociedade europeia e que mais tarde culminaria na Revolução Francesa. Em sua obra O Espírito das Leis, fruto de muitas viagens pela Europa (em especial à Inglaterra), analisa o funcionamento das instituições políticas, procurando entendê-las melhor. É nela que propõe a divisão do poder em três (executivo, legislativo e judiciário), de modo que ele não ficasse nas mãos de uma só pessoa, e que não existisse nenhum poder que se sobressaísse aos demais. Nesse contexto entraria o conceito de moderação: não permitir que nenhum poder se sobreponha a outro, desestabilizando, assim, a ordem pública e impedindo as liberdades individuais e a eficiência de uma sociedade. Seus pensamentos influenciaram, direta ou indiretamente, os novos governos formados a partir das revoluções dos séculos XVIII e XIX, em várias partes do mundo, inclusive no Brasil. Vejamos como elas foram aplicadas durante o período da independência.
O ano era 1824. Dois anos antes (1822) o Brasil havia se declarado independente de Portugal, porém ainda não possuía uma constituição. Em 1823, D. Pedro fechara a constituinte e formara um conselho especial para elaborar a carta constitucional. Assim nascia, em maio de 1824, a primeira constituição do Brasil, instaurando uma Monarquia Constitucional e hereditária. Entre seus principais pontos estava a divisão do poder em três, conforme as ideias de Montesquieu. Porém, a esses poderes ela acrescentava mais um, o poder moderador. Segundo a Constituição, esse quarto poder serviria para controlar os outros três, impedindo que um dos mesmos tentasse se sobrepor aos outros dois. A inspiração para esse último poder viria também da obra de Montesquieu, que era lida pelo próprio D. Pedro. Na atribuição de cada poder tínhamos: o legislativo sendo exercido pela Assembleia Geral (composta por câmara de Deputados e Senado); o judiciário pelo Supremo Tribunal de Justiça; o executivo pelo imperador; o moderador pelo imperador e por um Conselho de Estado.
Devido à forma como foi elaborada, a constituição formava um paradoxo: ao mesmo tempo em que os poderes eram divididos para evitar que um se colocasse acima dos outros, tínhamos um quarto poder que permitia ao imperador (detentor do poder executivo) interferir nas decisões dos outros poderes. Em outras palavras: o imperador, na prática, detinha um poder, digamos, “absoluto” dentro de uma monarquia constitucional. Se voltarmos para o pensamento de Montesquieu, veremos uma distorção da função do “poder moderador”. Um poder que deveria, literalmente, moderar a relação entre os três poderes sendo usado para favorecer um poder em detrimento dos outros.
Segundo o fato colocado acima, fica nítida a discordância entre a atitude de D. Pedro e as teorias de Montesquieu, onde o conceito de moderação viria para equilibrar os poderes, não dominá-los, como fez o imperador. Por tudo, podemos concluir que a aplicação das ideias do pensador não deu certo no Brasil imperial, pois faltou justamente a moderação.
segunda-feira, 19 de abril de 2010
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A inspiração para o quarto poder adotada por D. Pedro é inspirada em Benjamin Constant, portanto não está diretamente influenciada pela obra de Montesquieu
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